um mundo em que a maioria das culturas e dos povos conviva harmonicamente é possível?

A empresa multinacional estadunidense Nike publicou, no dia 30 de julho de 2020, uma propaganda cujo intuito era transmitir uma mensagem calorosa e apoiadora ao seu público consumidor, uma vez que criou um vídeo artístico que coloca vários atletas uns ao lado dos outros se apoiando. Porém, esta foi alvo de grandes críticas por cometer um grande ato de racismo com mulheres muçulmanas ao utilizar a imagem de uma destas, utilizando uma burca e transformando-se em uma imagem de uma mulher ocidental, que já não apresenta o uso da vestimenta tradicional do Oriente Médio. O imenso problema desenvolveu-se em virtude da narração do vídeo, dado que, no momento em que as imagens de ambas as mulheres aparecem, o texto reproduzido é “Caso você não se encaixem no esporte, que você mude o esporte”, o que deixa subentendido que mulheres islãs não se encaixam no ambiente esportivo. Tal problematização pode passar despercebida por muitas pessoas, principalmente para pessoas que não inseridas diretamente na cultura oriental. Por causa disso, tal propaganda permite que seja visto, de forma clara, como o etnocentrismo está em enorme vigor na sociedade em que vivemos, e, além disso, uma possível análise sobre um futuro em que a maioria das culturas e dos povos vivam de forma harmônica.

A priori, o termo etnocentrismo, desenvolvido principalmente na área das ciências sociais, pode ser explicado como o ato de diminuir a cultura alheia ou de acreditar que a cultura do indivíduo em questão seja melhor que a daqueles que o cercam. Esse comportamento não é recente, tendo em vista vários comportamentos etnocêntricos desde o imperialismo ou neocolonialismo, em que alguns países mais industrializados, como a Inglaterra, a França e os Estados Unidos, citam como motivo de controlar, direta ou indiretamente, países considerados “subdesenvolvidos”, devido ao ideal racista conhecido como o “fardo do homem branco”. Esse fardo é referente ao poema do inglês Rudyard Kipling, que declara que os homens brancos deveriam levar a civilização para aqueles locais subdesenvolvidos, como se fossem culturas atrasadas.

Ademais, uma pesquisa realizada pelo Instituto da Economia e Paz (IEP) revelou que 30 dos 35 conflitos armados ocorridos no ano de 2013 tiverem a religião como uma de suas causas. Religião também faz parte da cultura, dado que pode ser definida como um conjunto de hábitos, pensamentos e ações de uma população. Acreditar em uma divindade, por exemplo, faz parte de uma cultura, assim como se alimentar de um alimento específico. E, como reflexo disto, é possível observar que, por trás de todo conflito, por mais que não tenha a religião como principal impasse, existe etnocentrismo. Por trás de toda cultura, existe o relativismo cultural, assim como na propaganda realizada pela Nike. É praticamente cultural acreditar que a cultura alheia é inferior, no mundo atual, visto que isto vem sendo praticado por grandes potências desde o imperialismo e foi interiorizado (a famosa “síndrome do vira lata”) até mesmo em países “subdesenvolvidos”.

Como, então, seria possível viver em um mundo cujas culturas e povos pudessem conviver harmonicamente? Esse mundo não é real, mas é possível se aproximar dele por meio da comunicação. Um século tecnológico que, como grande característica, deu o poder de fala a muitas pessoas, é o ideal para o crescimento da tolerância e do diálogo. Através da indignação de muitas mulheres muçulmanas que falaram sobre a propaganda, é possível que a Nike e outras empresas (e seus consumidores) possam compreender o poder de escutar. Escutar e respeitar são fundamentais para um mundo mais tolerante e harmônico.

Maria Clara Lima Abrão

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